domingo, 4 de dezembro de 2011

Merci et à bientôt

Este é 200° post publicado neste blog. Apesar de haver outros 9 (logo, total de 209) em edição ha meses, eles não serão publicados, pois o momento do relato passou e a memória dos eventos já não está tão fresca. Acho que perde o sentido no caso de um blog, publicar um relato de algo de meses ou anos atrás. 

Este post de numero 200 é o último. C'est fini. A minha jornada chegou ao fim, como descrita no post anterior. Ha duas semanas comecei a trabalhar aqui em Recife, onde continuo na setor de P&D, mas com um D maior que o P. Portanto, um ciclo se fechou e outro foi iniciado. A jornada de ir para França acabou (voltei, Recife!), e outra foi iniciada aqui mesmo onde nasci e cresci. Vida nova, endereço novo, emprego novo.

É fato que eu queria ficar mais um tempinho pelo lado de lá (na França), e que até surgiram oportunidades, mas minha esposa não aguentava mais ficar longe. Ela insistiu na volta e entendo perfeitamente o lado dela, que sacrificou a vida (uma parte) e objetivos profissionais para me acompanhar em meus sonhos. Aconselho casais a discutirem seriamente decisões deste tipo para evitar futuros conflitos. De volta a Recife conheci, direta e indiretamente, casos de profissionais da área de TI que foram para Canadá, EUA e Inglaterra e que tiveram problemas de adaptação/insatisfação das esposas, tendo que optar pelo retorno como a maneira de manter o casamento. O caso delas ainda era "menos pior" pois eram profissionais com bons salarios enquanto nos tinhamos orçamento de estudantes.

Voltar
A experiência de ir e vir é problemática. Pode viciar e nos tornar nômades. Falei disso no blog de um amigo quando eu estava prestes a voltar. Até agora não me arrependi e por enquanto não estou com vontade de ir a lugar algum. Especialmente depois de uma volta complicada como a nossa. Gostaria muito que desse tudo certo por aqui pra eu não ter que ir atrás da grama mais verde do vizinho. Ainda mais com uma esposa traumatizada com o nomadismo. Mas, por incrivel que pareça para os que estao acostumados com a choradeira de meus posts, eu estou adorando estar de volta e nao sinto falta da França. Da mesma forma que eu nao sentia falta do Brasil quando estava la. Sinto falta das pessoas. Ah, da França estou com saudades do sistema de transporte. Nao tenho saudades do otimo vinho a preço acessivel (pensei que fosse ter), pois aqui é um inferno de quente e eu so quero agua, refrigerante e suco. Estou conformado com todas as diferenças sociais, e tenho convicção que o Brasil precisa de muita ajuda. Tentarei fazer minha parte, ainda que nao represente praticamente nada em relaçao à essa grande maçã podre. Resumindo: acho que não me tornei o chato que volta e fica "por quê na Europa isso, por quê nos EUA aquilo". E olha que tô sofrendo andando de ônibus, e até ja sofremos tentativa de assalto com menos de um mês aqui. Espero que nao role nada pior que essas coisas.

Agradecimentos
Agradeço a todos os que leram meus relatos, piadas, loucuras, baboseiras. O feedback, seja por comentário, email, gtalk, pessoalmente, etc, me estimulou a escrever mais. O blog serviu de terapia e procrastinação ao longo destes últimos 4 anos. Posts vomitados, outros caprichados. Posts genéricos ou pessoais. Úteis (como esse e esse) e inúteis (como esse). Outros, marcantes na minha jornada, outros marcantes para o resto da vida

Através deste blog fiz algumas amizades que espero manter ao longo da vida, e quem sabe conhecer ao vivo e em cores pessoas as quais mantenho contato apenas pela Internet. Aos visitantes que chegarem depois de hoje (que deixará de ser hoje em algumas horas), busquem pelas tags para ver se encontram algo útil em relação a ir morar ou estudar na França. Esta foi minha visão dos fatos, e portanto pode ser diferente da de outras pessoas. Fiquem à vontade em enviar emails ou comentarem os posts. Não prometo transformar respostas de emails em posts, como fiz algumas vezes, mas prometo respondê-los.

Aos visitantes antigos, regulares ou não, tendo o hábito de comentar ou não, peço um favor: que comentem este último post dizendo a cidade onde estão. O Google Analytics já informa isso neste blog, mas vindo do leitor acho a estatística mais humana e interativa :)

Como me disseram em Grenoble, amigos não dizem au revoir, dizem à bientôt (até logo).

À bientôt les amis.

PS1: Eu ia escrever um "balanço" destes quatro anos, mas desisti. Fica pra outro post... Eita! Acabou o blog e todos os "fica pra outro post" ficaram pra nunca.  
PS2: Se bater a vontade de blogar de novo (sobre outros assuntos), postarei o link do novo blog na coluna aqui ao lado. 
PS3: Clique aqui :)
PS4: Este post foi escrito com teclado QWERTY e concluido com um AZERTY. Leiam a mensagem da coluna à direita.
PS5: Acabaram os PS deste post :)


//acabou! valeu!
end blog;

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Longa viagem Grenoble-Recife

Chegamos em Recife no dia 24/10. Desta vez é para ficar, eu acho. Talvez por essa ansiedade do retorno a viagem tenha sido longa, cansativa e estressante. Talvez para valorizar a chegada. Sei lá. O que tenho a relatar é que foi caótica, e se não fosse pela ajuda de nossos amigos poderia ter sido pior. Foram várias etapas "dramáticas", descritas a seguir.


Mutirão em Grenoble
Eram 8 malas, duas mochilas, um bebê e um gato. Muita bagagem. Eu precisaria me transformar num octopus para carregar tudo. A estratégia foi deixar a maior parte na casa de um amigo que mora ao lado da gare de Grenoble, onde pegaríamos um trem para Lyon, e lá outro direto para o aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. Chegamos em cima da hora na gare. Nossos amigos já tinham levado parte das malas, e já sabiam o quai onde ia sair o trem. Uma amiga nossa tinha nos levado de carro e ainda tinha bastante bagagem. A galera veio ajudar buscando as coisas no carro e subimos correndo no trem, onde acomodamos a bagagem rapidinho. Não deu nem tempo de se despedir direito.

Troca de trens em Lyon

E agora? Como fazer para trocar de trem? 14 minutos de intervalo entre a chegada de nosso trem e a saída do TGV. Impossível eu dar conta. Minha esposa estava limitada a ajudar pois havia o carrinho de bebê com nossa filha e o gato para ela carregar. O namorado de uma amiga nossa mora em Lyon e foi "encarregado" do socorro. Pedi para ele levar dois amigos, mas conseguiu apenas uma alma caridosa para ajudá-lo. Eu nem sabia em que vagão estávamos para poder dizê-lo por telefone. Por sorte, o vagão do nosso trem parou ao lado de onde ele estava. 

Agonia para despejar as 8 malas. Levamos uma parte para o quai onde estava parado o TGV. Um de nós ficou vigiando as malas, e voltei com outro até onde estava minha esposa para virmos com o resto da bagagem. Conseguimos chegar com o trem ainda lá e já era hora do TGV sair. Jogamos tudo no vagão ao lado da rampa. Não era nosso vagão, e TGV tem lugar marcado. Não queríamos saber, apenas queríamos entrar no trem. Tudo certo. Todas as malas no trem. E um vagão bloqueado por nós. Ninguém passava. A porta automática do trem emperrando no carrinho da minha filha, que dormia como um anjo. As malas não deixavam ninguém passar. Fila de pessoas para subir a escada ao lado. O trem já tinha partido. Arruma mala aqui, ali. Passa um, passa outro. Joguei as malas todas no andar de cima.

Bagagem perdida no TGV
Stress para descer com as malas ao chegar em Paris. O controlador na estação avisado das bagagens não queria saber, ficou pressionando e dizendo que o trem não podia esperar.  Um passageiro ajudou a descer com algumas malas, cada uma em média com 30kg. Contagem rápida de malas: oito. Ok. Subida rápida no trem para desencargo de consciência, rabo de olho e descida rápida. O trem vai embora. Aliviado, empilho tudo em dois carrinhos. Conto novamente. Opa. Essa mala cinza eu nao contava com ela. Era a bagagem de mão da minha filha. Não era pra ter entrado na contagem. PQP!!! Cadê a mala preta? 

Achados e perdidos
Vou até o balcão de informação e me dizem que o trem ia para a estação Lille Flanders. Ligo lá e para Lille Europe, que gerencia os achados e perdidos. Apenas no dia seguinte poderíamos saber se a bagagem foi encontrada ou não. A SNCF, empresa dos trens, não se responsabiliza por bagagens perdidas e portanto é responsabilidade do passageiro ir buscá-la ou enviar alguém onde a bagagem estiver. E agora?

Gato com documentação irregular
Nossa passagem era pra ficar em fila de espera, pois foi com tarifa de dependente de funcionário da TAM (novamente, os amigos ajudando na viagem). A compra do bilhete do gato e da nossa filha seria feita na hora. O gato estava com o passaporte e vacinas em dia, mas também dependia de vaga no vôo. O máximo permitido é de dois animais domésticos no mesmo avião. Surgiu vaga no vôo. Beleza! Checa a documentação do gato. Cadê o Certificado Zoosanitario Internacional (CZI) ? PQP!!! Não pode voar. Ficamos em Paris para resolver. O dia seguinte era um domingo...

Sem teto no aeroporto
Antes de poder telefonar ou ir para a clínica veterinária precisaríamos passar a noite no aeroporto. Achamos muito complicado procurar hotel que aceite um gato como hóspede, além do incoveniente de 8 malas, sem contar com nossa filha e o carrinho de bebê. Além disso, a grana ia ser incoveniente também: taxi pra ir e voltar no hotel, taxi no outro dia pra ir ao veterinário, tudo caro em Paris, estávamos desempregados, etc. 

Comemos na McDonald's no piso térreo do Terminal 1, e nos instalamos nas confortáveis poltronas por ali. Tão confortáveis que vários sem teto aparecem por lá para dormir. Tem gente manjada, e o segurança chegou para tirar um de lá. Chamou uma mulher da administração, depois até a polícia. E nós do lado, com 8 malas, 2 mochilas, um gato e um bebê. O nobre segurança olha para nós, abatidos e com cara de sem teto (realmente estávamos sem teto) e pergunta "vocês vão viajar?".  Com muita indignação e num tom de "é óbvio, seu imbecil!", abri os braços apontando para as malas e disse "é claro!".

Desistimos de ficar por lá, pois tava crowdeado com sem teto, uns três. Tinha outras três ou quatro pessoas que pareciam ser passageiros mesmo. Mas na verdade não dá pra saber ao certo, pois os sem teto andam com malas nos carrinhos de bagagem para fingir que são passageiros.

Subimos para a área de embarque, onde estava tudo apagado e apenas o pessoal de limpeza. Dezenas de balanças à nossa disposição para refazermos as malas. Longa noite reequilibrando o peso. Nessa arrumação, nasceu mais uma mala. Agora eram nove. Dormimos muito mal, nervosos e preocupados achando que iam roubar a bagagem ou sequestrar nossa filha. 

Taxi uma ova
O domingo raiou, passageiros ocupando o aeroporto. Um grupo barulhento de muçulmanos subsaarianos nos acorda. Descer, tomar café da manhã no McDô,  e ainda tinha o documento do gato. O cara da TAM disse pra pegar taxi pra ir ao veterinário. Taxi uma ova. Eu vou é de trem. A ida e volta no RER ficou por 9,40 ao invés de ficar pra lá dos 50 se fosse de taxi. 

Mala achada
Voltei ao aeroporto com o documento do gato e fomos para a fila de espera no balcao de embarque. Antes, uma ligadinha para a estaçao de trem de Lille. O cara disse que acharam uma mala com a descriçao que dei e perguntou se era uma mala cheia de utensilios de cozinha. Ela mesmo. Cheio de coisas da Doce Sucré. Perfeito. O cidadao la falou que o protocolo foi gerado e a mala etiquetada. Agora eu teria dois meses para achar alguém para ir buscar a mala. Depois disso eles dariam fim a ela caso ninguém aparecesse.

Gato sem reserva no vôo de conexão
Chegamos em Guarulhos, tiramos as malas, fizemos alfândega e seguimos para o balcão de conexão. Descobriram que o gato nao tinha reserva até Recife. Não sabiam nem se o bilhete dele tinha sido pago ou não pois não constava no sistema dele. Decidimos que minha esposa seguiria com nossa filha no vôo pra Recife e eu ficaria para resolver. 

Tudo certo, a loja da TAM achou os dados informando que o transporte do gato estava pago. Lá vou eu no vôo seguinte, ainda tem stress no raio-X onde eu já tava de saco cheio de tudo e quase choro de desespero e raiva, pedindo pra me deixar ir embora. Fiquem com o gato, mandem por Sedex. Eu só queria chegar. Fui o último a entrar no avião, e como sempre todos perguntando: "é um cachorro?". Não, era um gato. Maldito gato. 

Voltei, Recife
Parafraseando a música de Alceu Valença: "Voltei, Recife. Foi minha esposa que me trouxe pelo braço".
Com a glória de Maomé, das tábuas de Moisés, do Bhagavad Gita, do Torá e de tudo o que é sagrado, chegamos ao Aeroporto Internacional dos Guararapes, rebatizado de Gilberto Freyre. A bagagem despachada seguiu com minha esposa. Eu só estava com minha mochila, um gato e um casaco pesado e inadequado para os 28°C que me esperavam naquele meio de manhã ensolarado de Recife. Jogo tudo em cima de um carrinho de bagagem, e dirigindo-me à saída do portão de desembarque vi uma mulher com o penteado e porte físico parecidos com o de minha mãe, que há onze anos estava no portão de desembarque do antigo aeroporto me esperando chegar de volta dos Estados Unidos, na mesma situação de mudança, mas sem esposa, sem filho e muito menos gato. Meus olhos se enchem de lágrimas. Um nó na garganta, pois rapidamente me dou conta que minha mãe já não está entre nós há quase oito anos. Engulo o choro e sigo caminhando. Saio, e não tem ninguém me esperando. Por incrível que pareça, só não me senti mais só por que estava com o gato.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Jeitinho francês

Em algum post neste blog já falei que várias pessoas já quebraram meu galho por aqui. Nada que fuja da legalidade, mas uma "mãozinha" que agiliza na hora que precisei. É normal muito francês não quebrar galho e dizer o velho désolé ("só lamento" numa boa versão brasileira humorada), mas eu dei sorte algumas vezes. Algumas quebradas de galho poderiam dar bronca pra quem fez, pois dependendo da interpretação do regulamento poderia-se considerar como fora da legalidade, mesmo que temporariamente. Posso contar pessoalmente a quem quiser, pois não quero deixar provas aqui, mesmo que o blog seja em português. Sei lá se alguém vai dedurar  :) 

A última quebrada de galho foi a acelerada na liberação do meu comprovante de defesa de doutorado. Eu tenho até agora o título verbal e testemunhas. Nenhum papel diz que eu sou doutor. Nesta época do ano (setembro e outubro), devido ao alto número de defesas de doutorado, o processo leva de duas a três semanas após a entrega da tese na biblioteca. Eu entreguei a minha segunda-feira passada. O colégio doutoral poderia me emitir uma cópia do documento esta semana, mas o original seria liberado só depois da validação na biblioteca. Mandei emails às diferentes pessoas, explicando a situação de que eu estaria voltando para meu país e que o documento seria necessário, esperar envio pelo correio ia complicar se parari parará etc e tal. O documento está pronto e liberado hoje, uma semana e um dia após eu ter dado entrada no processo. O problema é que se todo mundo pedir com urgência, sem realmente ser urgente, o termo banaliza e nenhum funcionário vai querer mais quebrar o galho de quem precisa.

domingo, 16 de outubro de 2011

Onde morar em Grenoble



Crio este post depois de ter respondido ao terceiro ou quarto email em que estudantes/pesquisadores me perguntaram "onde é melhor morar em Grenoble?"

Isso depende de alguns fatores, pois 'melhor' é altamente relativo. Uma regra geral é: Se quiser tranquilidade (ou monotonia) fique perto do campus, caso contrário busque morada mais próxima do centro de Grenoble. Se decidir ir para longe do campus, pense no transporte. Ônibus param de circular por volta das 20:30 enquanto os tramways vão até depois de meia-noite. Portanto, escolher apartamento perto das paradas de tramway é sempre uma boa. Um mapa da rede de tramway está anexado ao post, para referência. Há um outro post em que falo de moradia em Grenoble, de uma maneira mais geral.

Abaixo, uma lista não exaustiva das vizinhanças que acho interessante. 

Em Grenoble
  • Hypercentre: Gambetta, Cours Berriat, Alsace Lorraine, Felix Poulat, Felix Vialet, Gares, Jean Jaurès (uma parte dela passa no "hypercentre"). Pode-se tomar o tramway B, que vai ao campus.
  • Imediaçoes da Blvd. Foch (onde passa o tramway C, vai direto ao campus), inclusive as cidades de Seysssins e Seysinet-Pariset
  • Centro perto do Parc Paul Mistral (Norte da Av. Jean Perrot, Albert 1er de Belgique, Blvd. Clemenceau)


Sugiro evitar os bairros abaixo (os aluguéis parecerao sempre "tentadores" pelo preço abaixo da média): 
Villeneuve
Village Olympique
Arlequin
Teisseire
Abbaye

Estas são áreas de problemas sociais e delinquência, chamadas quartiers sensibles. Nada próximo de favelas, inclusive se voce passar por la pode até nao acreditar por serem areas tao bonitinhas, mas é melhor evitar.


Cidades Vizinhas
O campus na verdade é situado na divisa de Gières/St. Martin d'hères. Abaixo, as cidades (do tamanho de grandes bairros de metrópoles brasileiras) circundando o campus:

  • Meylan: bem caro, mas muita gente do campus mora por la. Facil para ir de bicicleta, mas precisa de 1 onibus e 1 tram se for usar transporte publico.
  • St. Martin d'hères: algumas partes, de preferencia perto do campos. O tramway D passa por lá, mas se ficar muito ao Sul o acesso ao campus é mais difícil.
  • Gières: Idem a St. Martin d'Hères, de preferência que seja perto do campus não muito longe do tramway B
O detalhe desta cidades acima é que ouvi falar (logo, carece de fontes) que imposto de moradia é mais caro em Meylan e St. Martin d'Hères.

Você que já mora aqui e você que já morou ou já esteve aqui talvez não concorde com minhas preferências acima, mas elas servem de base para você que virá e não tem o menor referencial ;)

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Gafes da defesa

Continuando sobre a defesa, cometi algumas gafes naquele dia:

  1. A defesa foi feita em francês, com slides em inglês e as perguntas previstas para serem em inglês para que dois membros da banca pudessem compreender. Até este ponto nada de gafe. Na primeira pergunta, interrompi o jurado depois de algum tempo dizendo: "poderia refazer a pergunta em inglês para que fulano e beltrano possam entender". Caiu a ficha para todos, e o resto das perguntas seguiu em inglês.
  2. Na hora de responder perguntas, chamei todos os jurados pelo primeiro nome. Um sacrilégio na lingua francesa referir-se à banca sem ser pelo vous e pelo monsieur utilizando sempre o sobrenome da pessoa. Como respondi em inglês, soaria estranho, eu acho. Além disso eu conhecia ja praticamente todos os membros da banca.
  3. Depois do titulo concedido verbalmente, tive que ser lembrado pelos amigos para dar o discurso de agradecimento. Esqueci de agradecer à banca...
  4. Na hora do pot de thèse, o coquetelzinho que tem depois, nao servi aos jurados. Abri um espumante e fui enchendo varios copinhos. Depois de alguns minutos quando todo mundo tava comendo e bebendo, chegou um membro da banca que eu ja conhecia e cochicha em tom de brincadeira: "tu sabia que o recém doutor deveria servir a bebida aos membros da banca?". Eu me desculpei e me defendi: "ninguém me disse nada" :)
Essas foram as que eu lembrei, ou que me chamaram a atençao. Provavelmente houve outras, pois quando comoetemos uma gafe geralmente nao nos damos conta...

domingo, 9 de outubro de 2011

Docteur Gama


Acabou.

Nesta ultima quinta-feira, dia 6/10 defendi minha tese e recebi verbalmente o titulo de Docteur en Informatique de l'Université de Grenoble.

Ao lado, uma foto tirada pelo meu colega Bassem. Imagem do doutorando Kiev sendo postada pelo Dr. Gama que escreve este post :)

Observem-me de pé, de frente para 4 dos 7 membros da banca. Como assim quatro? O computador à direita na foto era um membro da banca participando via video conferência no Skype. Ele estava na California, para um evento e acordou às 4:00AM no horario local, que era 1:00PM aqui na França. Esse foi talvez o ponto mais estressante antes da minha defesa. So consegui a conexao em video com ele uns dois minutos antes da banca chegar. Foi até um fato engraçado. Eu falei "Peter, o pessoal da banca acaba de entrar na sala", virei o computador pra os membros que depois se aproximaram para sauda-lo um a um, apresentando-se. Estranho. Ao terminar a minha apresentaçao, o jurado distante foi o primeiro a fazer as perguntas. Depois, virei o laptop onde "estava" o jurado distante para ficar de frente para a banca. Estranho. Ao final da longa sessao de questoes feitas pelos outros, a banca dirigiu-se para uma sala onde iriam deliberar o resultado para depois voltar e anuncia-lo. Peter foi junto, nos braços de meu orientador. Nao era bem ele carregado nos braços, mas o laptop. Muito estranho. E viva o Wifi, que permitiu ao jurado "caminhar" pelas dependências da Ensimag estando a milhares de kilometros de distância. 

Na volta, o resultado foi anunciado, aperto de mao com cada membro da banca, exceto Peter, que me felicitou verbalmente pois nao tinha como dar aperto de mao. Completamente estranho. Infelizmente este tipo de video conferência movel ainda limita os participantes em alguns aspectos, pois além de nao conseguir dar o aperto de mao, Peter também nao pode ir para o pot de thèse onde bebemos Clairette de Die (pronuncia-se 'di'), um tipo de espumante de uma cidade perto de Grenoble, e comemos varias coisas legais que minha esposa preparou.

PS: Voltei a escrever num laptop de teclado AZERTY, que em breve devolvo ao labô :P

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Desempregado e ilegal

Desde o dia 1 de outubro estou desempregado e ilegal na França. Minha última bolsa da UJF e meu último salário como monitor da Ensimag já foram pagos, agora já é Merci! Au revoir! Bonne continuation. O negócio de ficar ilegal já aconteceu antes de forma semelhante. Teoricamente eu já dei entrada numa extensão para ficar até o fim do mês e receberei algum papel pelo correio com uma autorização de permanência. Na prática, estou ilegal. Se a polícia me parar e pedir documento, o 'seu puliça' vai ver que o meu venceu dia 30. Apenas me pediram uma vez, em quatro anos vivendo aqui, quando eu passava na frente da gare SNCF (estação de trem), trajeto diário quando morávamos ali perto. Acho pouco provável que haja algum transtorno.

* O texto da imagem, numa tradução livre, quer dizer "Programarei em troca de comida". Não entendeu? Clica aqui pra ver como usa essa placa.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Primeiro Toco

Enquanto tem um bocado de neguinho foragido que faz doutorado com dinheiro brasileiro no exterior e não quer voltar dizendo que não tem oportunidades no Brasil, eu, que não usei um centavo do governo brasileiro, estou voltando e o CNPq me nega bolsa de pós-doc. Estou nacionalizando cerca de 100 mil euros que a França desembolsou comigo e minha família, entre bolsas, ajudas sociais, viagens à conferências, recursos usados no laboratório, etc. Supostamente eu deveria estar apto a formar pessoas e a fazer pesquisa.

Claro que o governo brasileiro não tem obrigação de me dar nada. Mandei um projeto de pós-doc que fiz com um professor da Federal. e avaliado por um comitê de especialistas. Recebi a notícia sem problemas. Mas depois de refletir sobre o que está descrito no parágrafo acima, fiquei chateado. Não vou estender a ladainha. Paro por aqui, pois ainda devo terminar meus slides pra  minha defesa na próxima quinta-feira.  Este é o primeiro toco que levo do Brasil, sem ainda nem ter chegado de volta, de vários que estão por vir. Apesar disso ainda me considero bastante sortudo em diversos aspectos. Ou será que eu fiquei mais sortudo depois que saí? Descubrirei isso em algumas semanas.

domingo, 25 de setembro de 2011

Defesas de doutorado na França

Post esquecido em modo edição há uma semana. Segue ele:

Apesar de eu nao saber em detalhe como funcionam no Brasil as defesas de doutorado, sei que em relaçao à França tem boas diferenças. Neste post detalho um pouco como funciona aqui na França, especificamente defesas de teses em Computaçao na academia de Grenoble.

No Brasil ouvi muita gente falar de uma etapa chamada de "qualificaçao", em que o doutorando apresenta o problema que esta estudando, a relevância, as abordagens e soluçoes propostas os avanços, etc. Pelo que entendi, tudo isso serve como uma pré-aprovaçao (malditos hifens que nao sei se ainda existem com a nova reforma ortografica). Depois de passar na qualificaçao o doutorando continua a redaçao da [dissertaçao |tese|manuscrito| o nome que você achar melhor] e defende dentro de alguns meses.

Aqui, como tudo na boa e velha França, tem uma deliciosa burocracia em um tempo curto que traz uma pitada de stress ao doutorando, especialmente se ele corre contra o relogio, como eu. Resumi em dez as etapas a serem seguidas:

  1. Escolha da banca examinadora: Normalmente escolhida pelo orientador, mas o doutorando pode "influenciar", como eu consegui. Propus três dos seis membros da banca (sete contando com o orientador). O maximo sao 8 membros na banca.
  2. Preenchimento dos formularios de defesa:  Detalhes da defesa (titulo da tese, abstrac, data e local da defesa, membros da banca, etc). Entregar papelada na escola doutoral.
  3. Envio do manuscrito aos revisores da banca: Os revisores da banca (normalmente dois) recebem um convite formal da univseridade, e o manuscrito de tese é enviado à eles por correio pelo doutorando ou orientador.  
  4. Relatorio dos revisores: Os relatores tem quatro semanas para enviarem um relatorio autorizando ou nao a defesa. Esse é o "go/ no go". Aqui os relatores dao sua apreciaçao num relatorio escrito. Eles podem dizer nao (e obviamente soliticar alteraçoes), podem dizer sim e solicitar alteraçoes, e podem simplesmente dizer sim. Os critérios de aprovaçao sao: satisfatorio, bom, muito bom, excelente.
  5. Validaçao e processo de entrada na escola doutoral (departamento de computaçao): Relatorio ok, Papelada pra ser assinada pelo diretor da escola doutoral. Processo deve ser iniciado 4 semanas antes defesa. Essa etapa dura dois dias no minimo. 
  6. Envio do dossiê ao Colégio doutoral (universidade): Papelada pra receber a assinatura do presidente da universidade (i.e., reitor). Entregar com no minimo com 3 semanas de antecedência da data de defesa. Estou aguardando esta etapa, que ao que tudo indica 
  7. Defesa: O grande dia. 45 minutos de defesa, pelo menos cerca de 30 minutos de perguntas. Depois a banca se tranca numa sala para a deliberaçao do resultado. Imagino que decidam rapido, mas ficam fazendo hora pra "valorizar" o protocolo. Depois de uns 15 minutos informam o resultado. Geralmente é positivo, salvo rarissimas exceçoes (eu nao sei citar qual foi a exceçao). Depois disso o pôt de thèse, um coquetelzinho pra confraternizar-se com a banca e os outros que estavam presentes na defesa. Um relatorio e mais papeis da burocracia sao preenchidos pela banca e o recém-doutor entrega no colégio doutoral.
  8. Versao final entregue à biblioteca : Até três meses depois do passo acima. Hoje em Grenoble ja nao é mais necessario imprimir a tese (um desperdicio, pois geralmente teses nao sao lidas depois de defendidas). Agora basta fazer o upload no site da biblioteca et voilà.
  9. Comprovante de defesa: Emitido até 3 semanas depois do passo acima ser validado pela biblioteca.
  10. Emissao do diploma: Esse é lento. Leva entre um ano e um ano e meio apos o passo acima.

Eu tive a reposta positiva na semana passada, e tudo esta entregue à escola doutoral. Um relator marcou  o resultado como "muito bom" e o outro como "bom". Fiquei bem contente, pois mesmo depois de um periodo turbulento do lado pessoal, consegui ficar acima do satisfatorio. No momento em que escrevo este post estou entre os passos 6 e 7.

Segundo o que conheç até agora, se o doutorando chegou até a etapa de defesa ja esta tudo "quase" garantido e o titulo é "quase" certo. O grosso do trabalho mesmo para alcançar o grau de doutor foi a escrita da tese, e obviamente toda a pesquisa conduzida para chegar ao conteudo apresentado na tese. Comecei a dizer que a defesa faz parte do processo de tortura. Na verdade, é uma formalidade que serve para o candidato apresentar seu trabalho e responder aos questionamentos da banca, provando que foi ele quem conduziu a pesquisa. Isso evita fraudes de teses "compradas" ou escritas por terceiros (ex: assessor de alguém importante e muito ocupado para escrever uma tese, como um politico).

Provavelmente as duas unicas pessoas do mundo que lerao tua tese de cabo a rabo sao os relatores (rapporteurs). Talvez existam três, caso o orientador o faça. Tenho a impressao que o meu pulou varias paginas da minha, levando em conta a distribuiçao de comentarios ao longo das paginas: trechos carregados de comentarios versus trechos (longos) sem comentario algum, nem mesmo um "ok" como ele tem habito de colocar ao lado de frases delicadas ou de trechos pesados complicados para entender.

Acho-me extremamente prolixo (tem nada a ver com lixo nao, viu? Na duvida posto o link pra o dicionario). Vide os tamanhos dos posts. O mesmo aconteceu com a tese, que eu queria que tivesse 120 paginas de texto. Terminou com 170 e se contar capa, indices, referencias, subiu pra 198. Eu mudei a formataçao varias vezes pra ganhar paginas e descer das 200 pra nao assustar os rapporteurs. Acreditem em mim, poucas pessoas se motivam a ler teses de computaçao INTEIRAS com mais de 200 paginas. E olha que o assunto que estudo nao é hardcore. Alguns podem até questionar se Engenharia de Software é mesmo "ciência" digna de titulo de doutorado. A versao final vai passar das 200 paginas pois adicionei um resumo de 5 paginas em francês (escrevi a tese em inglês).

A defesa
Voltando à etapa 7, sao 45 minutos de defesa, o que acho um pouco desproporcional em relaçao ao tempo levado para a pesquisa. Para ter idéia, o tempo destinado aos artigos de conferência (+/- 16 paginas) que apresentei foram de 20 ou 25 minutos para cada um. De qualquer forma, a capacidade des sintese e de abstraçao do doutorando é avaliada na defesa. Ja assiti a uma defesa em que a sessao de perguntas foi de 1:30

Fico aqui entao aguardando a chegada destes 45 minutos, ja ansioso para dar ponto final nessa etapa e começar a proxima. No meio tempo, preparo os slides da apresentaçao e imagino possiveis perguntas que a banca vai fazer. Dia 6/10 à tarde estarei no Amphi E da Ensimag apresentando. Mentalizem boas vibraçoes para mim :)

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Intercâmbio no Brasil

Quem quer ir fazer um intercâmbio no Brasil ?

Esta é a pergunta que sera feita dia 15 aqui na Ensimag, escola de engenheiros em Informatica de Grenoble que tem programa de intercâmbio com diversas instituiçoes no mundo, inclusive o Brasil. O convênio é com a UFRGS, uma as melhores na area de computaçao do paìs  O objetivo do journée Brésil é mostrar o valor desta experiência para os potenciais candidato, rapidas informaçoes sobre o Brasil, o idioma, as possibilidades, financiamentos, etc. Assisti ha uns dois anos, a titulo de curiosidade, e o professor que fala do Brasil é um francês  professor da UFRGS. Se eu nao estiver enganado, ja ouvi falar de dois franceses de la no departamento de Computaçao. Nao sei se ha mais. Aqui em Grenoble nunca ouvi falar de professor brasileiro, seja na UJF ou na Ensimag. Mas doutorandos eu posso chutar com confiança e dizer "tem mais de dez". Fora as dezenas que ja terminaram.

Devido a esta parceria, tem tanto estudantes de ca de Grenoble indo para la, como brasileiros vindo para ca. Muitos estudantes brasileiros vindos da UFRGS. Nos quatro anos em que fiquei em minha equipe, apareceram três estudantes da UFRGS e um deles continuou no doutorado. Da minha época, eu fui o unico brasileiro “sem convênio”. O interessante é que eu fui monitor da Ensimag por três anos, e dos mais de 200 estudantes que tive, nenhum era brasileiro. Como a disciplina era Banco de Dados, eu suspeito que eles ja devem chegar com o crédito do curso feito no Brasil. No ano passado ensinei Introduçao a Sistemas Distribuidos para o pessoal do ultimo ano, 53 alunos ao todo. Nenhum brasileiro.

O Brasil ainda é meio fechado para estudantes vindos de fora. Nao sou eu quem afirma, pois  isso ja foi tema da lista de discussao da Sociedade Brasileira de Computaçao. Aqui nao ha aulas em inglês, e duvido que haja em espanhol. Uma das melhores formas de criar vinculos com outros paìses e trazendo gente de la para estudar em seu paìs, ou mandando gente do seu para estudar là. Uma das maneiras de se fazer isso é criar programas de intercâmbio, como no caso acima. A tendência é a colaboraçao ir aumentando, e criar uma situaçao onde todos os lados ganham. Nao sei se com esse crescimento rapido (eu diria que esta inflando, ou inchando) talvez o Brasil mude mais a cabeça. O paìs tem ganhado bastante projeçao e confiança internacional, e muitos paìses querem estabelecer parcerias com ele. Talvez isso mude. Por enquanto, Dilma esta pensando em enviar milhares de brasileiros pra fora. Espero que nao vao com intuito apenas de passear, e que voltem também, com algo na cabeça.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Attestation d'accueil

Um estudante que esta vindo para Grenoble esta com duvidas sobre a attestation d'accueil, um documento necessario para apresentar quando o viajante que vem à França ficarà hospedado na casa de alguém. Aproveito a informaçao de utilidade publica, e escrevo este post baseado em recortes do email que enviei para ele:

Brasileiros (assim como varias outras nacionalidades que provavelmente nao estarao lendo este post escrito em português) precisamos comprovar que tem onde ficar ao viajar para a Europa. Seja com reservas de hotel (e dinheiro suficiente para pagar) ou mostrando que vai ficar na casa de alguém. Sim! MOSTRANDO. Para comprovar, é preciso apresentar um documento chamado Attestation d'Accueil emitido pela prefeitura de onde mora o seu anfitriao. Em 2009 fiz esse negocio duas vezes para visitas que recebemos. Se nao me engano, sao de 2 a 3 dias pra ficar pronto na prefeitura. Nota para os grenobloises: em Grenoble é no Hôtel de Ville, colado com o Parc Paul Mistral e nao na Préfecture (de l'Isère) que fica em Verdun). A emissao custa 30 euros, e o anfitriao devera comprovar enderenço, renda, etc. Os seguintes dados do viajante sao necessàrios:
  • Nome completo
  • Data da viagem e duraçao da permanência
  • Numero do passaporte e data de validade
  • Data e local de nascimento. 
*Importantissimo*: Você precisa apresentar o original entrando na Europa. Dependendo da viagem, atraso no envio, correios em greve, etc, o melhor a fazer é enviar uma copia scanneada (abaixo um exemplo, com os  dados apagados, por questao de privacidade). Pela data de emissao  recente e uma boa historia convincente, talvez o funcionario da imigraçao aceite. Um casal de amigos que nos visitou  fez isso em Portugal e colou, apesar deles terem levado uma bronca por terem mostrado uma copia do documento e que "aquilo nao valia de nada" segundo o simpatico e amavel funcionario no aeroporto. Também é possivel que cidadao com o carimbo na mao va com sua cara e nao peça nenhuma comprovaçao. Na duvida, melhor levar o papel.


Se for entrar pela Espanha, é mais complicado, como mostra o historico. Sugiro levar vacina contra gripe espanhola, certificado de reservista, fator RH, imposto de renda, carteira de trabalho, comprovante de salario dos ultimos 10 anos, e comprovante de renda antecipado dos proximos 30 anos para provar que você nao precisa imigrar pra Espanha para roubar emprego dos 20% de desempregados. Na duvida, melhor  levar também teste de HIV, pois como tem muitas brasileiras e brasileiros que vao se prostituir en España, é melhor mostrar pra eles que nao estao trazendo doenças.

PS: Nao sou vinculado a nenhum orgao publico. As dicas daqui valem hoje, mas talvez nao amanha. Leiam o lembrete na barra ao lado.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Vaporizador de Agua

Agua em spray. Eu nunca tinha visto. Nao sei se é novidade, mas eu apenas lembro de ter visto esse ano. No inicio do verao (junho) vi nas prateleiras do Carrefour, latinhas de agua em spray. Vaporizador ("brumisateur") de agua, da marca Evian. Achei o cumulo. Um absurdo. Um desperdicio. Abuso de nivel de industrializaçao e poder de compra. Coisa de pais rico cheio de frescura. Agua em spray? "Puro marketing pra tirar dinheiro de otarios", eu pensei.

Minha esposa comprou uma latinha, nao era Evian, mas era agua em spray. Nas noites quentes quando eu escrevia a tese com um ventiladorzinho que faz mas barulho do que ventila, morrendo de calor, eu testei a latinha. Minusculas gotas de agua pulverizadas em meu rosto trouxeram uma breve sensaçao de frescor (sem frescura, por favor). Tudo se encaixava agora e eu entendi a utilidade deste abuso de industrializaçao. Nao sei se a galera aqui substitui banho por isso. Sei la. Inventaram aqui os melhors perfumes do mundo pra encobrir o mau cheiro. Sabe-se la se eles enxergam isso com banho enlatado. Mas que ajuda, ajuda. O calor aqui no verao é de asfixiar. Agora a garrafinha de spray de agua é nossa fiel amiga dos dias e noites quentes.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Tramway cabadapeste

Sou fa dos tramways. Até ja falei deles rapidamente aqui. Acompanhando as noticias sobre o progresso dos trabalhos na infraestrutura das cidades-sede da Copa do Mundo de 2014, vi que algumas cidades cogitaram e algumas até escolheram o uso de Veiculos Leves de Transporte (VLT). Esse é o nome moderno do bondinho no Brasil. O famoso tramway que continua tramway na Europa, constrastando com os carros e ajudando no transporte em varias cidades em que estivemos como Karlsruhe, Bruxelas, Atenas, Strasbourg, Lyon e Praga, e com um charme especial em Portugal com bondinhos no estilo antigo em Lisboa e no Porto.

Era uma vez um VLT em Brasilia
Brasilia escolheu construir o VLT, a ser fornecido por um consorcio cuja tecnologia ficaria por conta da Alstom, megaempresa francesa que fornece equipamento ferroviario (trens, metrôs, tramways) entre outras coisas. Aqui perto de casa tem um escritorio da Alstom em um galpao, que se nao me engano é ligado ao braço deles que atua no setor hidroelétrico. Se estiverem precisando de usina nuclear em seu estado eles também constroem.

Mas falando dos VLTs, a Alstom implantaria em Brasilia os modernos Citadis, o mesmo tipo usado em Grenoble, onde atualmente moramos. Video em português explicando neste link do Youtube. Chegaram até a exibir o danado em Brasilia, como mostra este outro video. Mas, como Brasil é Brasil, a obra foi parada pois descobriu-se que foi SUPER FATURADA EM QUATRO VEZES. Era uma vez um sonho de primeiro mundo.

A Alstom também envolve-se em escândalos e esta ficando famosa em dar propina pelo mundo afora. Corrupçao nao é coisa so de brasileiro. A diferença é que no Brasil é exagerado e vai do policial da esquina ao pessoal do alto escalao do governo.

VLT "da mulestia"
Correndo por fora da Copa, surge o Metrô do Cariri (foto do post), usando VLTs em pleno sertao cearense. Minha admiraçao para os visionarios cearenses, que surpreenderam com a Troller no ramo automotivo, e agora com os VLTs fabricados pela Bom sinal. Tramways nacionais! Tramways brasileiros! Que sejam inferiores aos da Alstom, mas eles sao adaptados à realidade econômica do Brasil. Eu explico. A Bom Sinal argumenta que os atuais tramways usados na Europa, por exemplo, nao sao viaveis na maioria das cidades do Brasil devido ao alto investimento nas linhas elétricas que alimentariam os tramways. O custo por km seria muito alto. A quantidade de passageiros a ser transportada deveria ser muito alta para justificar os investimentos.

Para cidades de médio porte, como as capitais nordestinas, o ideal seria um VLT a diesel, que é o que eles produzem. Ele transporta mais passageiros usando menos combustiveis que ônibus, e o impacto no transito de veiculos automotores é minimo. Um argumento altamente gambiarra é o de aproveitar a malha ferroviaria existente, ajudanto os governos a nao investirem em novas linhas férreas. Gambiarra ou nao, a Bom Sinal esta em expansao. Maceio, Recife e Fortaleza sao outras capitais nordestinas que estao ou estarao em breve utilizando VLTs Bom Sinal.

Salvaçao do Caos do Trânsito Urbano
O transporte sobre trilhos de fato reduz o trânsito caotico das grandes metropoles.Talvez em Recife estes investimentos no VLT nao consigam trazer uma melhor significativa para o trânsito, pois os VLTs da Bom Sinal nao serao os usados nas linhas principais do metrô, nem para Sao Lourenço. Eles substituirao os velhos trens a diesel feioes que iam até o Cabo. O atual sistema de metrô ja funciona desde os anos 80, com algumas expansoes, mas sempre voltado para o suburbio. Enquanto em grandes cidades o conceito de metrô é urbano, em que você sai da estaçao e ja esta no centrao, o metrô de Recife é suburbano. O objetivo inicial dele foi de ligar o suburbio ao centro. Existe UMA estaçao no centro, e eu diria ainda que é "periferia do centro". Para os que conhecem Recife, imaginem um metrô passando pela Av. Conde da Boa Vista ou pela Agamenon Magalhaes. Isso sim seria o conceito de metropolitano que se usa nas grandes cidades. Agora vao fazer um "puxadinho" para chegar até a cidade do estadio da Copa, Sao Lourenço da Mata, quase saindo da Regiao Metropolitana do Recife em area limìtrofe com a Zona da Mata.

Os usuarios do metrô em Recife sao pessoas que utilizariam transportes publicos de uma maneira ou de outra. Enquanto nao houver metrô nos bairros de classe média, o metrô nao representarà reduçao de trânsito. Por exemplo, um metro cortando o coraçao de Boa Viagem e indo até o centro salvaria a cidade do caos crescente. Vejam o exemplo na França, salva por tramways:



No Ceara nao tem disso nao
Apesar de tramways funcionarem em varios paises, nao creio que o modelo de mistura-los com o trânsito de carros daria certo. Acho que deve ser metrô elevado (ex: Recife) ou subterraneo (ex: Sao Paulo).
No Brasil nao motorista educado, nao senhor(a). Se eu ja vi colisao com tramway na Alemanha, imagina com os motoristas mal-educados brasileiros. Olha o desrespeito dos motoristas combinado com a provavel falta de sinalizaçao no Metrô do Cariri:


Além de outros transtornos como este aqui, causado pela falta de passagens sobre ou sob os trilhos:


Acho que nao adianta querer imitar o primeiro mundo. Nosso povo é diferente. Precisamos adaptar as boas idéias à realidade brasileira, até que as geraçoes futuras se eduquem, em diversos aspectos inclusive em educaçao no trânsito. O tramway, aliàs, o VLT, ja temos no Brasil e Made in Brazil, falta apenas adaptar melhor a um modelo compativel com a realidade nacional.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Brasileiros em Grenoble II

O post anterior puxou esse outro aqui.
Apesar das dezenas ou mesmo centenas de brasileiros, eu nao conheço muitos. Coisa minha mesmo. A maioria dos brasileiros que conheci aqui e com quem mantenho contato acho que foi através de minha esposa. Nao sou muito simpatico com estranhos. Acho que nem sou muito simpatico, apesar de brincalhao. Se eu ver alguém falando português é muito dificil que eu venha a falar "Ah, você é brasileiro? Quer ser meu amigo?". Aprendi a ser desconfiado com brasileiros pelo fato de eu ter morado alguns anos nos EUA, onde brasileiros dizem pra "ter cuidado com brasileiro". Estranho que sempre me falavam para nao confiar em mineiro de Governador Valadares. Nao entendo porque logo de Valadares. Eu até conheci um pizzaiolo muito gente boa que era valadarense, e que dizia também pra nao confiar em gente de Valadares. Bizarro. Mas eu nao confiava nele.

Na França, minha posiçao mudou. Nos EUA eu era um pobre trabalhador tentando a vida, na França eu sou um pobre estudante tentando a vida acadêmica. Essa historia de desconfiança parece mudar com estudantes, pelo menos foi o que vi por aqui. Nao acho que tenha esse negocio de passar a perna ou de querer se aproveitar, como acontece com muito imigrantes brasileiros em paises de primeiro mundo.

Entretanto, minha esposa conheceu uma pessoa que me fez voltar a pensar no que dizia meu colega pizzaiolo valadarense. O contato com essa amiga foi, de uma maneira geral, algo do tipo "Oi, sou brasilieira também. Quer ser minha amiga?". Em um local publico ela ouviu que eu conversava em português com minha esposa. Amizade relâmpago que deixou minha esposa muito magoada. Nada de passar a perna ou de se aproveitar, mas foi coisa de mulher mesmo. Coisa de amizade, falsidade e diversos outros fatos bizarros, que terminou chateando minha esposa. Falo sempre pra ela que essa amizade estranha terminou servindo para colocar outras pessoas legais no caminho dela. Coincidentemente (ou nao) essas pessoas legais terminaram se afastando da tal amiga de comportamento questionavel.

Filho, nao fale com estranhos
Acho que aprendi bem aquele conselho que ouvimos quando criança: "nao fale com estranhos". Nao importa a nacionalidade. Talvez se eu estiver a Sibéria e passar por um cara com fisionomia de brasileiro falando português eu possa puxar papo. Talvez. Mas nao o farei em Grenoble, Paris, Tokio, ou onde for. Se a pessoa estiver no meu circulo social, eu tento falar, claro. Nao sou chato de galocha. Apenas chato. Por exemplo, se o compatriota estuda na mesma sala que eu, eu me dirijo até ele e troco idéia, claro. Se for do meu laboratorio, vou trocar idéia sempre, tomar café, falar de futebol, do Brasil, da França, de computaçao ou do que for. Esta "promiscuidade" em fazer amigos é algo natural quando se esta longe da terrinha. Em Manaus por exemplo, existe uma confraria de pernambucanos, que fundou o Galo de Manaus, em homenagem ao Galo da Madrugada de Pernambuco. O maior bloco de carnaval do mundo! Lembram da megalomania pernambucana de que sempre falo?

Quanto à promiscuidade em fazer amigos por aqui, tive algumas experiências traumatizantes, duas delas relatadas a seguir, e uma positiva:

Brazuca chato No. 1
Levei um "/ignore" no primeiro evento de doutorandos que fui no LIG. Fui ver o poster de um cara e ja cheguei perguntando "Você é de que estado? Bla bli". Ele respondeu o que eu tinha perguntado. Depois falou um "da licença" virou as costas e foi falar com sei la quem. Baixei minha cabeça, enterrei o queixo no peito, botei a mao esquerda no bolso, chutei o vento, enxuguei a lagrima com o indicador direito. Dramatico, nao é? Brincadeira. Apenas pensei, com muita raiva: "FDP, e eu perdendo tempo aqui querendo dar uma de simpatico. Por isso nao falo com esses brazucas metidos a merda que se acham alguma coisa por que estudam na Europa". Bom, essa uma teoria de uma amiga de minha esposa que ja voltou para o Brasil, pois ela também teve encontros deste nivel com outros brasileiros. Sei la. De repente nao tem nada a ver. Talvez ele fosse pouco simpatico, como eu. Ou nao. Vai saber...

Brazuca chato No. 2
Depois de dois anos, o trauma de "busca aleatoria de amigo compatriota" passou. Tentei estabelecer contato ano passado com outro homo sapiens sapiens brasiliensis. O especime era especificamente um homo sapiens sapiens brasiliensis australis que aparentemente tentava acasalar-se com uma homo sapiens sapiens norvegiana. Tenho bons amigos mexicanos, que sao da minha equipe, e estavamos na festa de aniversario de outro mexicano. Um deles chegou pra mim e falou "tem um amigo brasileiro teu aqui, vamos falar com ele". Fui até o compatriota que cortejava a gringa, cumprimentei-os e me apresentei. Depois de um dedo de prosa em nossa lingua mae, falei pra ele que meu amigo mexicano sabia falar português. Ele vomitou todo o linguajar polido que eu o havia ensinado. Eram frases complexas, que iam de elogios à mae a questionamentos sobre a sexualidade. Nao tinhamos bebido tanto. O (fingiu que) riu da brincadeira, e trocamos mais meio dedo de prosa. O compatriota revelou-se ser um homo sapiens sapiens brasiliensis australis stupidus e manifestou um pouco de pressa e repelência ao falar conosco. Eu e meu amigo borracho percebemos e nos afastamos. Este me disse "tus amigos brasileños son todos unos pinches culeros", que esta longe de ser um elogio. Ainda bem que eu nao ensinei piada de gaucho, senao a conversa teria sido mais breve ainda.

Brazuca Bacana
Rarissimas sao as exceçoes de eu "falar com estranhos". Uma delas foi no aeroporto de Lisboa. Olhei pra um cara, e do nada perguntei "tas indo pra Recife também?". Sim, ele estava indo. E ele tinha vindo de Grenoble. E tinha dormido no aeroporto de Lyon na noite anterior, igual a mim. Tinhamos tomado o mesmo ônibus Grenoble-Lyon e o mesmo aviao Lyon-Lisboa. E nao lembramos de termos nos visto la. Em Lisboa ficamos conversando, tomamos o mesmo aviao para Recife, mas viajamos em poltronas distantes. Ele voltaria alguns meses depois para um pos-doc de um ano. Passei o endereço do blog pra ele ver se achava alguma informaçao util e mantivemos contato desde entao. Hoje somos bons amigos, ele ja esta de volta à Maceio, e tenho certeza que manteremos contato apos retornarmos ao Brasil.

Nada contra
Que fique claro: nao tenho nada contra brasileiros. Apenas nao sou de fazer amizade em paradas de ônibus/tramway nem sou de procurar comunidades de brasileiros. Para os recém chegados, ou que planejam vir, nao levem em conta minha experiência. Ela é a minha. A de vocês pode ser outra. A brazucada aqui é animada. Busquem as comunidades do Orkut (até quando ele existir) onde o pessoal organiza peladas, churrascos, festas, etc ou vao ao Bukana pub, onde sempre tem evento brasileiro. Mas tentem nao esquecer de que vocês vieram (ou virao) aqui para estudar.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Brasileiros em Grenoble

Grenoble recebe estudantes brasileiros ha um bom tempo. As universidades possuem antigos convênios com a UFRGS, além de outros com outras instituiçoes como USP e varios programas de intercâmbio de estudantes.

Nesta época do ano começam a chegar alguns brasileiros por aqui. Estava eu esperando o tramway B no campus deserto em periodo de férias. Atravessam a linha do tramway três brasileiros: um rapaz e duas moças. Pareciam recém chegados que provavelmente acabaram de abrir conta no Société Générale, pois saiam da agência e falavam em bolsa e nao sei quantos euros e nao sei o que mais. Percebi que eram compatriotas, provavelmente de SP ou PR, dados os erres caprichados. Continuei caladinho lendo la no banquinho da parada mas com dificuldade, pois nòs brasileiros somos muito barulhentos. Chegou outro cara, de mochila, caminhando e fica em pé la na mesma parada.

Depois de um tempo o tramway vem chegando e o trio brazuca fala "esse é o B, mas o C nao aparece no horario ali do painel". O rapaz de mochila que estava em pé, ao lado, fala em português do Brasil: "pra onde vocês querem ir? O tram C nao esta passando aqui". Aih eu falei também, no meu dialeto pernambuquês compreensivel em quase toda Terra Brasilis: "Oxe! Até u dia 21 u terminau dêli é na parada Les Taillées. Vocêr teim ki trocà di tram la, visse?"*. O rapaz do trio brazuca fala, com muito espanto: "Nossa! Todo mundo é brasileiro aqui?".

Bienvenues à Grenoble. Alias, bem vindos à Grenoble. Em português mesmo.

* A bizarra transcriçao fonética nao padronizada é meramente ilustrativa e exagerada. Num total de 9 anos morando fora de Pernambuco e convivendo com brasileiros de diversos estados, meu "sutaki" enfraqueceu, mas continua pernambucano.
Versao em pernambuquês: Essa frase foi so pra arriar, ta ligado véi?

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Headhunters e outra laranja azeda

A Orange é uma empresa de origem britânica que foi comprada no ano 2000 pela France Télécom (FT), uma estatal francesa que ha alguns anos tornou-se economia mista, tendo capital aberto mas com o governo frnacês sendo um dos maiores acionistas. Pequeno parentêses: a FT é aquela empresa que de vez em quando aparece noticia falando da onda de suicidios devido a supressao de empregos supostamente estaveis.

Voltando à laranja, ela é uma marca presente em quase toda a Europa e em expansao na Africa. Apesar da giganteza da FT (empresa ocupando a posiçao 105 no ranking mundial, segundo o Wikipedia), imagino que a marca France Telecom deixara de existir em breve e dara lugar à Orange, tipo a Oi substitui a marca Telemar. Hoje em dia, na França, a Orange é fornecedora de telefonia movel, Internet, VoIP e TV por assinatura, com milhoes de usuarios, além de prestaçao de serviços de consultoria em Informatica. Os laboratorios de pesquisa FT foram rebatizados ha alguns anos e chamam-se Orange Labs (mais um sinal da mudança gradativa para o nome Orange). Sao 18 laboratorios de pesquisa no mundo todo, 8 deles na França, sendo um em Grenoble.

Laranja 1
A Orange é aquela empresa com nome de fruta que falei aqui, sobre o pos-doutorado fechado que declinei. Como parte do processo informal do convite, eu ainda fui no fim de abril apresentar minha pesquisa la. O que fiz no mestrado e continuei no doutorado. Era semana de férias la e ainda assim foi bastante gente assisitir. Depois da minha apresentaçao de 1h15 ainda teve bastante discussao e otimas criticas e sugestoes que me ajudaram na escrita da tese. Ao final, serviu como uma pré-defesa, mas o pos-doc ja estava azedo desde janeiro/fevereiro.

Laranja 2
Coincidentemente, eu estava de passagem no laboratorio hoje e recebi uma ligaçao de uma pessoa da Orange Labs dizendo que viu no calendario de defesas de tese da universidade de Grenoble que eu estava com minha defesa agendada. Ele falou que o meu perfil se encaixava para trabalhar num projeto de pos-doc de um ano para o desenvolvimento de middleware para a Livebox, um modem multifunçao usado para TV, Internet e VoIP (nosso segundo serviço de Internet, descrito neste post) e creio que o produto que é o principal alvo dos projetos de pesquisa, inclusive o da laranja azeda numero 1.

Como o cidadao estava procurando alguém para esta vaga, ele perguntou se eu estava interessado na oferta e se poderia me enviar detalhes. Expliquei que eu estaria sim, mas por uma decisao familiar eu volto para o Brasil apos a defesa da tese. Azedou de novo a laranja. Perguntei até se ele conhecia André, o contato da laranja 1, e ele disse que sim mas que eram de equipes e projetos diferentes. Passei o contato de três outros colegas que seriam potenciais candidatos. Ou é coisa de "destino" querendo que eu fique na laranja, ou realmente é uma mega empresa com um gigante braço de pesquisa com varias oportunidades. Considerando o principio da navalha de Ockham, eu ficaria com a segunda explicaçao.

Headhunters e a Internet
Informaçoes publicadas na Internet ajudam muito a expor o profissional. Graças ao meu perfil no LinkedIn, fui contactado em diferentes momentos por três headhunters oferecendo oportunidades na Irlanda, India e França, respectivamente. A oportunidade da Irlanda era muito tentadora, com uma oportunidade bem no meu perfil e para trabalhar com OSGi (a implementaçao feita na minha tese se apoia nesse "bagulho").

Minha pagina pessoal também serviu para me contactarem. Uma empresa italiana propôs dar um treinamento de MS-Office em Angola, alegando que o fato de eu falar português e estar baseado na Europa me qualificaria. Nao sei de onde vieram com a parte do Office... Tem um caso meio viajado de um(a) chinês(a) que me viu o site pessoal e me contactou pelo LinkedIn também, enviou um email mal escrito em inglês dizendo que gostaria de fazer pos-doc na minha equipe e perguntou se eu poderia dar-lhe uma oportunidade. O inglês da pessoa ta ruim ou ela tem disturbio de atençao, pois se lesse o texto do site e do LinkedIn veria que sou PhD student.

Eu nao tinha duvidas que a Internet é uma otima vitrine profissional, e depois destes contatos aleatorios pude ver que realmente tem gente por aih "caçando cabeças" baseando-se em informaçoes encontradas na rede.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Médicos 24h

Falei da saga de minha esposa em hospitais em outro post, e frequentemente nossa filha adoece como todo bebê que esta desenvolvendo o sistema imunologico. Varias vezes precisamos de consultas de urgência e como ja estamos acostumados com o péssimo atendimento de urgência, digno dos hospitais publicos brasileiros, muitas vezes acionamos o serviço médico de urgência por telefone.

Como nao temos familia aqui, ficamos meio desesperados quando aparece doença. A ultima "mazela" foi mês passado, quando apreceu uma infecçao renal em minha esposa, logo apos minha filha ter adoecido (acho que era um resfriado). Ficaram as duas doentes e meu nivel de pânico subindo com tese pra terminar e o povo todo doente aqui. Mesmo depois de medicada minha esposa estava tendo febre perto de 40°C. Liguei pra um serviço de urgência do SAMU*, que sempre usamos (08 10 15 33 33). O médico atende em alguns minutos e depois da descriçao dos sintomas e de ter falado da medicaçao, ele sugeriu mudar para Ibuprofeno, que tinhamos em casa. Funcionou que foi uma beleza. Niquel, como dizem aqui. Logico que o cara do outro lado nao é negligente e vai receitar remedio controlado. O maximo que ele faz é sugerir tratamento.

Foram muitas vezes que ligamos, mas eu so consigo lembrar especificamente de alguns casos:
- Constipaçao de mais de 48h do bebê (narrado aqui)
- Queda de bebê batendo cabeça no chao (nao deixar ele dormir logo apos a queda e observar durante as proximas 24h se algo fora do comum se passa)
- Infecçao renal da esposa (caso acima)

Toda a assistência que tivemos aqui no pré-parto e pos-parto, creche, serviço médico por telefone, entre outras coisas, nos supriu bastante a falta dos conselhos de nossos pais e demais parentes. Claro que a familia é insubstituivel do ponto de vista afetivo, mas o meu ponto aqui é que a assistência que nos foi dada nos deixou bastante seguros em varios momentos onde o desespero toma conta de alguns casais que sao pais de primeira viagem.

Para os que estao no Brasil fica o relato, e para os que estao na França fica o relato e a dica, caso precisem de um médico de madrugada.

* Numero usado na regiao de Grenoble para falar com médicos de plantao nos horarios de 18h as 8h e em fins de semana e feriados, em caso de emergências nao vitais. Nao sei informar se o serviço é em toda a França. Verifiquem o SOS médecins caso esse numero nao funcione em sua regiao.
Caso seja algo muito sério, discar para o SAMU usando o numero 15.

domingo, 31 de julho de 2011

Desmotivaçao pos-tese

Li muito material sobre escrever teses, se motivar para o doutorado, como ser um bom estudante de doutorado, e coisas nessa linha. Um dos textos que li, acho que foi desse livro, diz que apos concluir a redaçao da tese bate um vazio, uma depressao, devido ao fato de um grande desafio ter sido superado e depois dele nao haver nada de tao grandioso ou desafiador em vista. Adoro metaforas, e crio uma para ilustrar: é como se você estivesse subindo uma ladeira ìngreme com muito esforço, você chega no pico e depois tem uma descida onde nao precisa mais de tanto esforço.

No meu caso ainda nao posso dizer que cheguei nesse pico maior, talvez tenha uma ladeirinha ainda, pois ainda nao tive a resposta da banca (mandei a tese ha quase duas semanas). Eles poderam "azedar" tudo e dizer que preciso trabalhar mais, e com isso tenho uma nova ladeira ingreme pela frente. Ou podem apenas dizer que esta tudo OK e mandar tocar pra frente, defender, e partir pro abraço (no meu caso, partir para o Brasil).

No meio tempo, nao tenho nada "grandioso" a ser feito. Tem o resumo estendido da tese a ser redigido em francês (eu escrevi a tese em inglês), umas 4 ou 5 paginas bastam. Fora isso, voltar a escrever um artigo pausado ha meses e sobre algo quase completamente desligado de minha tese. A outra opçao de atividade, como passatempo mesmo, é programar no projeto open source em que participo.

Nesse mesmo meio tempo, vou dedicando mais tempo à minha filha, que nos diverte cada vez mais com tudo que ela vem aprendendo. Tempo de ouro esse que todo mundo fala que passa rapido. Eu confirmo. Se eu estivesse trabalhando numa atividade regular (normal, se preferir que eu chame assim) tipo trabalhar de 8 à 12hrs e de 14 à 17hrs, eu teria perdido bastante disso.

E no meio tempo, o mesmo dos dois paragrafos anteriores, eu retomo atividades Internéticas que infectam o ocio e alimentam a procrastinaçao: sites de noticias, facebook, youtube, Google reader e minhas dezenas de feeds RSS. Depois de uns 10 dias dormindo de 7 a 9 horas por noite eu regulei o meu sono e ja consigo ficar de pé até 2 da manha. Por exemplo, agora sao quase 2 e estou por aqui.

Como é verao na Europa, e é época de férias, no Campus ja nao tem quase ninguém. Agosto é o mês que a França praticamente para (especialmente o mundo acadêmico). Talvez seja toda essa atmosfera de férias que me motiva muito a nao fazer algo produtivo, ou talvez seja mesmo essa tal de desmotivaçao pos-tese.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Creches na França

Antigamente, no mundo dos nossos avos, bisavos, as esposas abdicavam de suas vidas para se dedicarem ao lar, cuidando da arrumaçao, da cozinha e da prole. E que proles numerosas antigamente! Agora a historia muda, e as mulheres ha decadas ja saem de casa para continuar os estudos e trabalhar. Mas e quem cuida das crianças? Esse é um dos grandes problemas de casais do mundo moderno. Morando na mesma cidade da familia, tem sempre a vovo' pra quebrar o galho, ou uma tia, ou até mesmo o vovô. Mas e se nao tem ninguém da familia pra ajudar? O que fazer?

No Brasil tem babà a preço acessivel para as classes média e alta, afinal a diferença salarial é gritante. Pagar um salario minimo nao é nada para muitos casais de classe média que possuem renda familiar de 5, 10, 15 ou sei la quantos salarios minimos. Ha quem prefira deixar filhos em hotelzinho, berçario, escolinha, ou algum outro local conduzido por profissionais com formaçao na area. Além do fato da maior parte das babas nao terem formaçao especifica para educar crianças, existe o receio de maus tratos. Mas isso também nao deixa de acontecer em espaços coletivos no Brasil, mesmo que com menor frequência (o caso da creche em Goiânia).

Serviços sao carissimos no primeiro mundo e a renda é bem distribuida. Ganhar 5 salarios minimos na França nao é comum. Para você ter idéia, um professor universitario no Brasil inicia ganhando mais de 13 salarios minimos. Na França o mesmo cargo inicia com pouco mais de um 1,5 (um salario e meio). Professores de longa data conseguem ganhar 3 salarios minimos ou mais. Perceberam a diferença? Tudo bem que a França paga mal, o povo francês sabe e vive fazendo greve por isso e outras razoes mais. Percebem a dificuldade de pagar uma babà? Quais seriam as alternativas entao?


Modes de Garde
Logo apos o nascimento de nossa filha, eu fui até o Pôle Petite Enfance, da prefeitura de Grenoble. A fila de espera por vagas em creche é gigantesca, e so é possivel marcar um horario para se inscrever depois que a criança nasce. Nada de tentar ganhar tempo fazendo a inscriçao enquanto o bebê esta na barriga.

Nossa filha nasceu em Janeiro de 2010. Telefonamos para la e conseguimos horario para sermos atendidos em fevereiro ou março, nao lembro bem. Eu fui la sozinho. A esposa preferiu ficar em casa cuidando do bebê, mas la tem muita gente que vai ser atendido e leva o bebê ... porque nao tem com quem deixar.

A atendente explicou que existem diferentes modes de garde ("modos de guarda"). Resumindo eu entendi o seguinte :
  • Assistente maternal: Baba, ou nounou (leia-se "nunu"), que tem curso e é homologada pela prefeitura. Você deixa o bebê na casa dela. Existe um limite maximo de crianças de acordo com normas legais (ex: 2 bebês que andam e 1 bebê de colo; 1 bebê que anda e 1 de colo caso more em apartamento sem elevador). Se você algum na França dia avistar na rua alguma mulher com muitas crianças na faixa étaria de até 3 anos, provavelmente ela é uma nounou que esta levando os bebês para passear.
  • Assistente em domicilio: Baba na sua casa, com contrato assinado, exclusividade, férias, etc. Ou seja, formato similar ao que se usa no Brasil. A diferença é que sera uma pessoa que estudou, teve treinamento para esta funçao e provavelmente fala corretamente e você nao tera problemas em corrigir erros de linguagem que seu filho adquiriu com a baba (ex: oitcho, muntcho, cumê, pobrema, etc). Nao é preconceito nem piada. Estou falando sério. No Brasil a regra geral é que baba é subemprego de gente desqualificada (no sentido intelectual). Meus pais e minha irma me falavam que eu era sem noçao e aos 5 anos de idade (eu sou anormal mesmo, comecei a ler meio cedo) corrigia erros de português das babas, e teve uma que até se interessou a aprender a ler por causa de mim.
  • Halte Garderie: Algo como uma "creche quebra galho". Você se inscreve e liga pra ver se tem vagas. Nao existe regularidade de deixar o filho todo dia. O horario é montado sob demanda.
  • Creches da prefeitura de Grenoble: Estabelecimentos coletivos onde as crianças ficam um ou dois turnos, com periodicidade definida através de um contrato.
  • Creches da CAF: A CAF é aquele orgao que falei que da ajuda moradia. Eles possuem centros sociais (algo muito legal, que gostaria de falar em outro post) e creches. O funcionamento é similar ao das creches da prefeitura, mas como sao gerenciadas por outro orgao eu teria que ir diretamente la.
Algumas halte garderies também acumulam funçao de creche, ou seja, algumas crianças tem horarios fixados por um contrato e outras vagas sao flexiveis no formato "quebra galho". A creche da foto acima (eu sou "o cara alto" na foto) é onde nossa filha vai e funciona assim. Existem outros tipos de creches: creche de associaçao de empresa, de bairro, de pais, etc, etc. Mas esses sao os modelos, digamos, homologados para poderems ser subsidiados pela CAF.

Conseguir vagas é muito dificil. A creche de nossa filha foi a 4a. opçao que tinhamos feito. Varias pessoas que conhecemos disseram que nosso tempo de espera foi muito curto (menos de 6 meses), e normalmente pode durar até mais de um ano. Como tudo é feito baseado nas declaraçoes de imposto dos dois anos anteriores, nos fomos beneficiados por ter um ano sem renda. Eles dao prioridade a que tem renda baixa, para a pessoa ter mais oportunidade de trabalhar. Interessante o modelo que tenta ser justo.
A "formula" que minha esposa escolheu foi creche meio tempo (mi temps): 5 turnos, ao invés de 10 (temps plein). Eu queria que ela ficasse horario integral. Meio tempo quebrou geral e era o caos completo em relaçao ao tempo e correria. Conversem sobre isso antes de terem filhos: quem vai cuidar do bebê e como sera.

Ja um colega do laboratorio, que tem um filho nascido dois dias antes da minha filha, se inscreveu para deixar o filho numa nounou. A escolha é feita pelo Pôle Petit Enfance de acordo com vagas e o bairro da pessoa. Se os pais nao aceitarem, um abraço e volte ano que vem. O meu colega disse que chegou no primeiro dia, atendeu uma mulher de preto. Era a nounou. Ele entrou na casa com a esposa e o bebê deles. Deu bom dia ao marido da nounou que tinha cabelo grande e unhas pintadas de preto. Meu colega e a esposa sao equatorianos, catolicos praticantes. Preciso explicar mais? Um abraço e volte ano que vem. Hoje ele se arrepende um pouco do preconceito que teve, e precisou procurar sozinho uma nounou. Demorou algumas semanas pendurado no telefone até encontrar uma.

Alocattions Familiales
Além da moradia, eles também ajudam com outros tipos de alocaçoes familiares, o equivalente no Brasil aos programas que levam "bolsa" na frente (bolsa escola, bolsa familia, bolsa cachaça, etc). FHC e Lula nao contaram que isso existe ha anos em varios paises da Europa como forma de distribuir renda e amenizar as dificuldades financeiras das classes mais baixas.

No contexto do post (cuidar dos filhos), a CAF complementa o pagamento da creche ou qualquer que seja o "modo de guarda" (mode de garde) que os pais escolheram para cuidar da criança. Nao tenho certeza se o modo "quebra galho" das halte garderies sao subsidiados pela CAF, mas no caso das nounous e dos outros modos acima ha o complemento. O meu colega que nao curte unha pintada de preto tem reembolso da CAF relativo a uma parte do que ele paga à nounou. No nosso caso o desconto ja é direto, e so pagamos a diferença. O preço da creche de nossa filha seria uns 250 euros por mês, mas pagamos apenas 60. Se continuassemos aqui, no ano que vem aumentaria pois nossa declaraçao dos ultimos dois anos renda seria maior, o que diminui os subsidios.

De um jeito ou de outro, as "caridades" estao acabando. Se ficarmos por aqui o historico salarial vem aumentando e as ajudas sociais tendem a desaparecer. Se voltarmos nao tem nada disso de ajuda social, mas na verdade acho que teremos mais opçoes: e$colinha$, ajuda da vovo materna ou semi-escravatura de uma baba ao modico preço de um salario minimo (do Brasil, claro).